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segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

O Poder da Escolha Consciente - Eco Trip/ Take 20

Dia 19 – 31 de Agosto

As estórias que a histórias fala...


Esta noite nas montanhas foi soberba! Tendo em conta que estamos à beira de uma auto-estrada e que o silêncio se parece mais com o de uma estância de repouso! Nem mesmo a modernidade de uma construção desta envergadura a cortar caminho por dentro dos montes das Astúrias conseguiu remover a pureza do ar límpido que aqui se respira… Puro e muito muito fresquinho…

A tiritar de frio mas por outro lado revitalizados por estarmos aqui, convertemos a carvan em veículo turístico e aprontamo-nos para rumar a Léon.

Anteontem tínhamos em vista seguir pela costa norte, mas dadas as condições atmosféricas acabámos por mudar de trajeto por isso nem mesmo os planos com a duração de um par de dias conseguem resistir à imprevisibilidade da vida em fluxo contínuo. Não conseguimos estar noutro lugar que não o que estamos no momento, aceitando com simplicidade o estado natural de mudança que se nos apresenta sem aviso, mas sempre em harmonia com as nossas escolhas do dia e mais ainda – com as nossas escolhas para a viagem.

Deixar fluir, rendidos à simplicidade de Ser momento a momento, apreciando a abundância plena e completa da vida em si mesma – é esta a nossa grande escolha para a viagem inteira.

E para o meu dia de hoje a escolha é absorver a sabedoria em equilíbrio pacífico, onde quer que vá, totalmente rendida à minha Essência.

É esta a placidez que me envolve por dentro e por fora aquando da chegada a Léon – cidade sossegada mas com um casco histórico bem movimentado, onde visitamos a sua portentosa catedral gótica por estarmos fresquinhos acabados de acordar e porque o valor do ingresso é muito baixo, quando comparado com a maioria dos monumentos por onde passámos até agora.



Andamos pela cidade durante cerca de duas horas, como de costume. Palmilhamos tudo o que nos parece relevante, ainda que saibamos que cada um dos sítios que temos visitado se prestaria a dias inteiros, até mesmo mais do que um, em cada lugar. Mas a natureza e propósito desta viagem é outro… como disse, viver em fluxo contínuo, como um rio, acompanhando o movimento do espaço/tempo sem sairmos do nosso lugar seguro – bem no nosso centro, sem sair nunca do Aqui e Agora.



Urge-nos de seguida visitar Zamora – tão famosa devido ao tratado de Zamora, um marco de paz assinado a 5 de outubro de 1143 entre D. Afonso Henriques e o seu primo Afonso VII de Leão e Castela, data esta tida como a data da Independência de Portugal.

Muitas e rocambolescas histórias se passaram aqui. Tenho a certeza. Cada pedra da rua ecoa os cascos dos cavalos, o arrastar de pés descalços ou os tacões da nobreza, a azáfama do dia-a-dia de época após época. Gentes que viveram e pereceram numa imensidão de estórias mais ou menos sofridas.


Poder observar assim a realidade como se de um cinema se tratasse, com o mesmo desprendimento quer se trate de uma estória alheia ou da nossa própria, devolve-nos a capacidade de perspetiva e permite-nos escolher que caminho seguir.

A antiguidade mistura-se com a modernidade e de uma forma ou de outra a busca foi, é e será a da Paz.


Se cada ser humano percebesse que ela reside no seu cerne e retirasse a armadura, o escudo e a espada, fazendo as pazes dentro de si mesmo, esse jogo terminaria e teríamos todos uma experiência bem diferente aqui na Terra. Mas como isso só pode ser feito querendo, cabe a cada um decidir se quer paz ou guerra e ,querendo paz, fazer o que é necessário para implementá-la de dentro para fora.
Em última instância é o Amor mesmo, a única coisa que importa e ele só possível com o advento da Paz interior.

É com estes pensamentos sentidos a povoarem-me o silêncio interno, que me aparece mesmo ali de caras, este marco:


E como se não bastasse ainda este poema que tão bem descreve o meu, o nosso, sentir:



Está decidido. O Romeu passa a ser o Romero!

Mas de que é que estou para aqui a falar, perguntas tu?

É que o meu carro foi batizado de Romeu na sua viagem de estreia nas minhas mãos, em que viajei com amigos até à região da Bretanha no norte de França. E porquê Romeu? Bem, porque em primeiro lugar fiquei apaixonada por este carro logo da primeira vez que me sentei ao volante e senti como a sua condução era suave e fluida. Daí a Romeu foi um passo. É que o GPS, que de início ainda tinha pio, era interpretado por uma mulher – a Julieta, designámos nós na viagem inaugural.

Mas na verdade Romero faz bem mais sentido! Este carro vem destinado a levar-me a lugares magníficos. Tem sido um desfilar de viagens absolutamente maravilhosas desde que veio para a minha mão em abril de 2014. E nem tem muitos quilómetros, mas os que tem são de muita qualidade.

Foi assim que rebatizámos o carro!... A carvan, digo.

Andámos já uns valentes quilómetros e estamos indecisos entre comer aqui – já passa da uma hora – ou seguir e fazer um lanche daqueles nossos.

Optamos por ficar e escolhemos um restaurante no centro histórico com um menu completo a bom preço e que nos parece terá qualidade.

Por mais estranho que possa parecer escolhemos bacalhau, um bacalhau que acaba por ficar marcado na lista dos melhores que comi até hoje! É fresco, e isso faz toda a diferença. Macio e saboroso como não comia há muito.

A comparar com as nossas refeições habituais, trata-se de um farto repasto, saboreado com muito apreço e gratidão.

Mais uma vez, chegámos a meio do dia e já estamos com o depósito de felicidade bem cheio, mas ainda assim vamos ter que continuar a enchê-lo. De todo o modo, tudo o que transborda não é desperdiçado. É a dádiva que deixamos pelas ruas onde passamos… Assinado: Com Amor <3


Salamanca é o nosso próximo destino.

Bem famosa, claro. Mas nunca tinha lá ido.

Aqui até as paredes ecoam sabedoria e ainda que seja uma urbe onde vemos mais jovens que em qualquer outro lugar onde estivemos, os seus edifícios são antiquíssimos. Uma pessoa deve sentir-se mais sábia mal entra nas salas destas faculdades seculares, de certeza.



E há espaço para comédia também ;)



Hoje deve ser o dia dos casamentos. Para além de gente gira e jovem com ar estudantil vemos gente muito aperaltada e de repente saem os noivos de dentro de uma igreja. Ficamos sentados numa escada a observar e a descansar. A questão é que quando nos levantamos e seguimos, mais adiante há outro casamento, e ali outro! Nunca vi tanto casamento na mesma cidade ao mesmo tempo.

Sente-se o borbulhar feliz dos corações dos noivos e dos seus familiares, a euforia da celebração de um contrato para muitos anos, espera-se. E que sejam alegres e amorosos. Ainda há gente que se casa, afinal! 😊

Passamos por entre os convidados, os bagos de arroz e as pétalas de rosa espalhados pelo chão, até chegarmos à praça central que mais uma vez nos inunda com a sua grandiosidade.



Uau! Tanto. Tanta beleza. Cada pedra retalhada fala. Apetece ficar e ouvir as suas histórias tim tim por tim tim.



Mas não. É mais uma vez uma passagem, breve mas plena. Como a vida que amamos.

Breve até nem é. Desde que vivo graciosa e plenamente a vida parece-me bem longa. É tudo uma questão de perspetiva.

Com a barriga cheia de arte e saber, saímos de Salamanca e rumamos em direção a Plasencia e depois Portugal. Não sabemos onde vamos parar hoje, mas pouco importa.

Apanhamos a A-66 – Ruta de la Plata – e as planícies imensas, cultivadas e cuidadas, estendem-se a perder de vista, como mantos de terra fofa. O verão já vai longo e as colheitas já foram, mas nada está ao abandono.

Admiro a forma organizada como em Espanha se aproveitam os recursos e se torna o país o mais autossuficiente possível. É verdade que o tamanho ajuda, mas trata-se também da mentalidade empreendedora que não se fica pelas ideias e mete mãos à obra.

O entardecer chega depressa e decidimos sair da autoestrada para procurar um camping numa estrada nacional que indica a vila de Hervás como local histórico. O nosso raciocínio é que se há um lugar turístico tem que haver um camping, até porque os “nuestros hermanos” são fãs desta prática.

Bem dito e bem feito. Aparece-nos um camping onde paramos e escolhemos ficar.

É um lugar sossegado com muitas tendas grandes e permanentes. Vem aqui pelos vistos muita gente passar férias regularmente.

O talhão que nos calha está bem situado, debaixo de uma árvore para nos fazer sombra de manhã – ainda que saibamos que vamos acordar cedo, como de costume. Temos água mesmo ao lado da tenda, para lavar um tareco ou outro, há piscina, café, bons balneários. Estamos em casa por hoje.

À noite bebemos um chá no bar e ficamos por ali a pesquisar a net e a carregar os telemóveis até sentirmos que são horas de aterrar na cama mais fofa do mundo, pelo menos para nós, aqui e agora.


sábado, 20 de janeiro de 2018

O Poder da Escolha Consciente - Eco Trip / Take 18

Dia 17 – 29 de Agosto

Gratos por Tudo


Acordamos cedo com o chilrear dos passarinhos, aconchegados no silêncio doce das árvores, com a força telúrica da terra onde estamos deitados a encher-nos os depósitos de felicidade, mais confortáveis nos nossos colchões de esponja que se estivéssemos numa cama numa estalagem da vila.

Esteve a chover de noite, por isso decidimos deixar a tenda a secar debaixo do sol ténue que espreguiça os seus raios por entre os ramos das árvores e nos aquece levemente com o seu Bom Dia.

Este cenário define a minha escolha do dia: absorvo a graciosidade da existência com cada respiração, conforme vivo em total rendição à minha Essência.

Saint-Jean-Pied-de-Port é uma histórica vila de passagem de peregrinos, bem referenciada no caminho de Santiago. É por isso que há lojas com haveres necessários para uma demanda tão longa – boas e robustas botas para caminheiros, capas para a chuva, cantis, mochilas, bengalas de suporte para tornar o trajeto mais ligeiro… enfim, tudo o que alguém que quer caminhar cerca de 800 quilómetros, se este for o ponto de partida, pode necessitar. 


Este é, de facto, o ponto mais popular para quem inicia a senda a partir de França. Esta é também tida como a última paragem antes da árdua passagem pelas montanhas dos Pirinéus e faz parte do acervo da UNESCO enquanto Património da Humanidade.

A vila é pequena mas muito bem conservada. Tem o encanto de uma maquete toda arrumadinha, sem mácula que se aponte.



Estas vilas típicas fazem-me sempre lembrar as casas de bonecas que me faziam acercar das montras das lojas e adorar visitar museus dos brinquedos quando era miúda.



Ao passearmos pelas ruas damos com um painel que explica a história por detrás da romaria a Santiago de Compostela.



Reza a história que Tiago o Grande foi um dos primeiros apóstolos de Jesus e pereceu em Jerusalém no ano 44 DC. Diz-se que foi decapitado pelo rei Herodes Agripa que se opunha à nova religião. Diz a lenda que dois discípulos trouxeram o seu corpo de volta para a Galiza de barco e que o seu túmulo foi descoberto por um ermita que foi conduzindo a esse lugar por uma estrela no século 9. Nesse tempo era comum a adoração a relíquias e o lugar depressa se tornou num grande centro de peregrinação, comparável com Jerusalém e Roma. Campus Stellae ou “Campo das Estrelas” depressa se tornou Santiago de Compostela e a igreja católica implementou a construção de um templo romanesco que viria a ser uma das mais imponentes catedrais góticas da Europa.

Ora, perdoem-me os crentes, mas criar a partir de uma lenda tamanha azáfama, em que se fazem promessas a um Santo cujas raízes são pouco claras e se espera que ao cabo de um sacrifício de centenas de quilómetros árduos o desejo pedido seja “concedido” não faz qualquer sentido. Primeiro porque não são os Santos, Anjos e nem mesmo o que se crê ser Deus que vêm salvar-nos das nossas amarguras, pois elas fazem parte do trilho humano na Terra e são precisamente o que nos permite ter o potencial para despertar do nosso sono ignorante de que somos impotentes perante as circunstâncias da vida.

É certo que muitas vezes as circunstâncias estão para além do nosso controlo e que não as podemos mudar, mas podemos mudar a forma como olhamos para elas e o que aprendemos com elas, e mais importante que tudo, podemos escolher o que queremos mesmo nas nossas vidas daí para a frente. O grande senão é que não podemos escolher por mais ninguém – o livre arbítrio assiste a todos e a nenhum de nós cabe a opção de usar o livre arbítrio do outro como nosso. Sendo assim, grande parte das promessas que se fazem e que implicam a “salvação” de outros (filhos, maridos e mulheres, tios, primos… etc) colidem em si mesmas com o livre arbítrio de cada um e por mais bem intencionadas que sejam, não deixam de ser um desrespeito pelo poder de escolha alheio.

Em segundo lugar, não é o nosso sacrifício que vai fazer com que Santos, Anjos ou Deus tenham pena de nós e nos concedam o “pedido”. Que Ser Pura e Plenamente Amoroso requereria o sofrimento de qualquer ser senciente para obter provas da sua beatitude e assim conceder-lhe algo? Isso seria chantagem, nua e crua - "se fizeres isto, dou-te aquilo". É um conceito estritamente humano e não pertence à consciência expandida onde não há requisitos desta natureza manipuladora. 

Ainda assim, para quem faz O Caminho como uma demanda espiritual, uma descoberta de si mesmo ao longo de cada passo, enfrentando os seus próprios fantasmas, incluindo a solidão, o medo do desconhecido e o desafio de ultrapassar adversidades e confiar que tudo é possível e que se chegará à meta desde que entregue ao coração – a Deus em nós – então será com toda a certeza uma experiência muito enriquecedora e iluminada em que ninguém retorna igual ao que foi.

Mas se é este um dos grandes propósitos, então há muitas formas de o fazer, sendo O Caminho de Santiago apenas um dos muitos caminhos, este já bem batido e até mapeado para facilitar a demanda.

Ora até esta nossa viagem é uma peregrinação dessa natureza, em que viajamos entregues à nossa Essência e descobrimos momento a momento como é viver em confiança total, sem planos definidos mas sempre entregues ao coração, em respeito pela energia que nos serve, poupando recursos de formas criativas e inexploradas, aliando o sentir ao pensar e experienciando na prática a liberdade de Ser uma respiração de cada vez.

Sinto-me feliz por poder permitir-me esta liberdade e saber que tudo está bem com toda a criação e que cada um virá ao encontro do que procura, independentemente da forma que escolha para o fazer.

Ao fim e ao cabo Deus reside e sempre residiu em cada um de nós e o Lar que tanto buscamos lá fora está e sempre esteve, dentro de nós, no nosso cerne incorruptível e imaculado.



Depois de um agradável passeio pela vila, voltamos para o camping para tomar o pequeno almoço, desmontar a tenda e seguir para Espanha.

As autocaravanas já se foram quase todas embora e a nossa é a única tenda ali. O senhor, dono do terreno, cumprimenta-nos e agradecemos-lhe a estada neste lugar de paz.

À saída de Saint-Jean-Pied-de-Port o Pedro decide ir comprar um queijo de ovelha diretamente do produtor e batemos à porta de uma casa particular onde nos atende uma senhora que nos mostra orgulhosamente as fotografias do armazém onde o filho faz estes deliciosos queijos.

A senhora corta um bom pedaço de um queijo enorme que deve ter uns 10 quilos e saímos sorridentes com a compra campestre, sabendo que parte será comido no caminho, ainda antes de poder ser oferecido à família aquando da chegada já não muito distante.

Um pouco mais à frente entramos na aldeia de Espelette. É dia de mercado e mesmo à beira da estrada há uma casa com um grande título cá fora: Chocolaterie Antton. Hum! Acho que temos que parar…


Ao entrarmos vemos um grande grupo de turistas que pelos vistos veio aqui numa visita guiada, pelo que este lugar parece ser um ponto de paragem obrigatória, tal como sentimos.

É uma fábrica artesanal de chocolate e esta é afinal de contas um importante região de produção de pimenta de uma variedade que foi batizada com o nome da localidade: Espelette.

O cheiro intenso a chocolate entra-nos pelas narinas adentro, produzindo uma espécie de delírio prazeroso. Afinal nem é preciso comê-lo para ter efeito nas hormonas do bem-estar!

Decidimos comprar um frasco de pasta de chocolate com avelãs que tem um sabor absolutamente divinal e uma barra de chocolate com pimenta de Espelette que também provámos na loja e aprovámos.

Esta barra de chocolate passa a ser a nossa sobremesa, um quadradinho de cada vez, bem degustado e recebido pelo nosso palato com uma sinfonia de requintado prazer.

Estamos mesmo mesmo à beirinha de Espanha e fazemos uma última paragem em França, em Saint Jean de Luz que nos foi recomendado visitar, antes de passar a fronteira invisível que separa os 2 países a que pertence a mesma região do País Basco. Ou seja, a região é a mesma, mas estende-se ao longo de dois países.

Esta coisa das fronteiras sempre me intrigou e por outro lado não deixa de ser um apontamento cómico sobre como tentamos definir limites no que é em si mesmo ilimitável. Mas a bem da boa governança entende-se que o estabelecimento destas orlas imaginárias que separam uma área política de outra possam facilitar o governo das massas de gente que habitam cada território.

Em Saint Jean de Luz paramos só à beira mar antes de seguir adiante. 

A cidade costeira de San Sebastian é a primeira paragem em Espanha. Chove a cântaros e daí para a frente o tempo começa a piorar de tal maneira que há momentos em que não se consegue ver mais que uns 2 ou 3 metros à frente. 





Com a chuva intensa a dificultar a visibilidade e o dia escuro decidimos procurar um lugar para pernoitar, desta vez num hotel ou alojamento local. Seguimos umas placas que indicam esta última opção e chegamos a uma quinta com várias casas, todas em pedra, muito bonitas e bem arranjadas. 



Batemos a uma porta. Ninguém atende. Depois a outra e aparece uma jovem para a nossa idade que nos indica que a sua mãe está na casa onde batemos primeiro. Voltamos lá e uma senhora muito simpática mostra-nos o quarto que custa 45€ e tem casa de banho privativa. Não tem multibanco pelo que vamos ter que ir à vila mais próxima levantar dinheiro.

Hoje o dia de viagem terminou cedo e sabe bem poder ficar na cama a ler e ouvir a chuva a cair lá fora.


Deitamo-nos cedo, gratos por tudo. 

quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

O Poder da Escolha Consciente - Eco Trip / Take 19

Dia 18 – 30 de Agosto

de Alma e Coração


Este lugar é super sossegado, tirando os hóspedes do quarto ao lado que decidiram falar, “brincar” e depois sair de saltos altos e voltar tarde, tivemos uma noite tranquila.




Ontem a senhora da casa recomendou-nos um monte de sítios para visitar, orgulhosa da sua zona, mas claro que não vamos poder ir a todo o lado.

Escolhemos passar por um dos sítios que ela referiu – Portugalete (o nome ficou-nos no ouvido…) – mas só depois de passar por Bilbao.

Chegados a Bilbao o que queremos mesmo ver é o Museu Guggenheim – por fora, claro, que entrar lá dentro levaria um dia inteiro a visitar.

Wow! Que criação magnífica! Damos a volta completa ao edifício e não há ângulo que não seja fotogénico! É impressionante como foi possível criar um edifício assim. Uma obra de arte gigantesca, tal como as catedrais que temos visto no caminho.





Há uma exposição fotográfica que mostra como era este lugar antes – um estaleiro feio e cheio de negrume dos tempos de fábrica. Foi daí que surgiu o impulso criativo para esta gigante “escultura” – a temática fabril, de estaleiro portuário.





E agora este espaço está totalmente reabilitado, respirando vitalidade e modernismo, limpo e irreverente.






É daqueles sítios que se visita e se fica cheio de um não-sei-quê tilintante, aquele frenesim que enche as veias de paixão pela vida. Hummmm que bom é transbordar de criatividade e inspiração!



Até o cão feito de flores à entrada desta Catedral das Artes é simplesmente fabuloso!




Estamos nem sei dizer como. Acho que as palavras chegam a ser demasiado limitadas para descrever estas sensações de bem-estar, equilíbrio, placidez, sei lá, é um transbordar de plenitude. De tal forma que num semáforo à saída de Bilbao há uma estátua que vista de um certo ângulo parece Jesus a descer dos Céus e a abençoar-nos em pessoa!



E agora é a vez de Portugalete.

Esta cidade tem a ponte transportadora mais antiga do mundo – a primeira a ser construída em 1893 e é hoje Património da Humanidade. É uma espécie de ferry suspenso por uns cabos que através de umas roldanas colocadas numa estrutura de ferro desliza de um lado ao outro do rio, levando carros e pessoas.



Valeu a pena vir ver, não só a ponte transportadora (rolante – como lhe chamam aqui em Espanha), como o resto da vila com um arquitetura interessante.




 Paramos algum tempo num bar para tomar um chá de roiboos com baunilha e comer uma tortilha e depois não resistimos a um bolo comprado numa pastelaria que nos piscou o olho logo à chegada a Portugalete. Os bolos são tão grandes que acabamos por ficar empanturrados de doce! Especialmente porque não temos comido este tipo de coisas. Hoje já não vamos comer durante umas largas horas, de certeza.


Trouxe a saqueta de chá para por numa das garrafas de água 😉 Assim temos chá fresco num instante, o resto do dia.

A chuva decidiu dar-nos tréguas para podermos passear e ainda bem, porque não temos roupa nem calçado para este tempo. De todo o modo sabe-nos bem o tempo mais fresco.

Não é de espantar que a chuva tenha amainado, porque na verdade fizemos a escolha de poder visitar Portugalete de forma simples e confortável e ainda que não sejamos donos e senhores do clima, de uma forma ou de outra chegámos na hora certa, em sincronicidade para encontrar o resultado da nossa escolha.

A minha escolha do dia, esqueci-me de te dizer, é: Serenidade em total entrega à minha Essência.

E não podia deixar de ser assim, porque ao cabo de tantos dias em liberdade total, com tantas horas de silêncio, apenas sentada no carro a apreciar as vistas, não posso estar senão em Serenidade.

É como se a minha Essência me tivesse convidado para ir a um jardim botânico mas num carrinho que me leva pelo parque, para apreciar tudo só pelo gosto de apreciar. É assim que me sinto.

Ah, mas tenho que te explicar o porquê do nome: Portugalete.

Enquanto estamos a olhar para o mapa, numa das ruas da cidade, uma senhora simpática pergunta-nos se precisamos de alguma coisa. Diz-nos que trabalha para a câmara e que está ao nosso dispor. 

Ficamos maravilhados! Uma funcionária pública a oferecer-se para ajudar turistas na rua!!! Que privilégio. Seja como for não temos, assim de repente, nada para perguntar.

Ela segue o seu caminho e depois lembramo-nos que lhe poderíamos ter perguntado qual é a etimologia do nome da cidade. “Mas adiante, a oportunidade já passou” – dirás tu.

Errado. 

Quando vamos a chegar ao carro, com quem é que nos cruzamos novamente, mesmo em frente ao posto de turismo? Com a senhora simpática que começa por dizer-nos que adora Portugal e que costuma ir lá passar as férias do verão todos os anos. Isto porque lhe dizemos que somos de Portugal e estamos intrigados com o nome da cidade.

Ela sorri, e informa-nos que, apesar de parecer ter alguma coisa a ver com Portugal há várias hipóteses e nenhuma delas inclui o nosso país. A mais plausível é que a palavra seja uma combinação de Portu (porto) e Galete (galeão), sendo este um importante porto de passagem.

E fica assim satisfeita a nossa curiosidade. Agradecemos e despedimo-nos para seguir rumo a... bem, isso decidimos entretanto, deixando que o nosso "faro" para lugares magníficos nos guie.

Para não destoar, a próxima paragem é num lugar igualmente deslumbrante, mas desta vez de cariz Medieval. Chama-se Santillana del Mar e está situada na região Espanhola da Cantabria. Ficamos fascinados com o estado de conservação impecável de todo o casco histórico, o pitoresco e antiquíssimo esboço do que seria a vida há algumas centenas de anos atrás. Pertence com muita dignidade à rede das aldeias mais bonitas de Espanha.




A igreja românica é uma relíquia encantadora, como aliás tudo o resto aqui.


Diz-se que é a Vila das Três Mentiras porque não é um Santo (Santi), nem plana (llana), nem fica perto do mar. Mas o nome deriva de Santa Juliana (Santa Illana) cujos restos mortais se encontram na dita igreja.

Perto de Santillana situa-se a Caverna de Altamira, um dos conjuntos pictóricos mais importantes da pré-história e faz parte, mais uma vez, do Património Mundial da UNESCO.

Ainda chegamos a ir até à entrada mas decidimos não apear-nos para a visitarmos desta vez. Pode ser que de uma próxima que passemos de novo por estas paragens a visitemos.

Seguimos para San Vicente de la Barquera, uma vila- baía à beira das Astúrias. Outro lugar muito bonito e harmonioso, com praias, rio, história e serra tudo à mistura.






Quanta beleza aguentamos num dia?... Resposta incógnita! Realmente é preciso ter um coração forte para aguentar tanta abundância, tanta intensidade de uma assentada só!

A próxima paragem é em Ribadesella onde encontramos um extenso relvado à beira do rio, com bancos e mesas e água para lavarmos a loiça do almoço/jantar.

Adoooro andar assim ao ar livre todo o dia! Sinto-me como uma Pocahontas, irreverente e descomprometida com os desígnios sociais que normalmente nos restringem. E ainda por cima tenho a honra de poder viajar com um companheiro igualmente índio! Pode dizer-se fielmente que toda esta combinação é perfeita – nós, os lugares por onde passamos, a harmonia que sentimos e vivemos, a cumplicidade no sentir e no discernir. Se “Perfeito” existe é isto.

Depois de algum tempo no relvado imenso onde observamos a calma que inunda as pessoas ao passearem em torno deste verde à beira-rio, seguimos para Cudillero – uma vila costeira que a Sara (de Barcelona) nos recomendou vivamente.

Passamos ainda por Gijón no caminho, mas não paramos.

Chegados a Cudillero vemos um amontoado de casas, empertigadas por uma escarpa acima, todas umas em cima das outras, com cores diferentes como se fossem um bouquet bem arranjadinho para oferecer a uma bela dama. É realmente fora do comum este vilarejo piscatório e vale a pena a visita.



O sol põe-se no horizonte, difundindo uma névoa rosa alaranjado e as luzes da aldeia começam a acender-se, cintilando monte acima como uma árvore de Natal.


Subimos pelas ruelas estreitas, tal e qual cabras montanhesas em busca de um poiso mais alto para mirar a paisagem que se estende mar adentro, até onde a vista alcança. A dado momento decido parar de subir, já vi o suficiente, mas o Pedro ainda sobe mais. Combinamos encontrar-nos lá em baixo.

Há imensa gente a chegar para o jantar. Deve comer-se aqui excelente marisco e “pescado”, como se diz aqui em Espanha. Mas nós já temos o papo cheio, de comida e de beleza, por isso basta-nos desfrutar do panorama invulgar de Cudillero.


Faz-se noite rápido e é hora de arrepiar caminho para descobrirmos o "hotel drive-in" para a noite.

Tomamos o caminho para Léon mas como esta é uma zona extremamente montanhosa, optamos pela autoestrada.

Estamos confiantes de que vamos encontrar uma boa estação de serviço algures, brevemente.

Enganamo-nos.

A montanha é tão íngreme que não há espaço para grandes estações de serviço e ao cabo de uns bons quilómetros, vendo que esta estrada tem pouquíssimo trânsito, decidimos parar numa daquelas áreas de repouso à beira da autoestrada, só que esta é super pequena, mas ainda assim absolutamente tranquila.

Está um frio de rachar e aprontamos a nossa carvan num instante! Lavamos os dentes com água da garrafa e estamos prontos para uma boa noite de sono. Ao menos hoje não temos que nos ralar com o calor e podemos dormir aconchegadinhos debaixo dos nossos sacos de cama que até agora pouco usámos.

E que sossego! Já para não falar do ar puro de montanha que nos enche os pulmões e a alma.

Hummmm! Bons sonhos <3